quarta-feira, junho 22, 2011

Leste inventado


Ando com saudade de ser amado. Ando só. Com vontade de ver, de ter, de ser mais. Ando preocupado com a vida. Tenho andado muito, muita coisa. Tenho sido menos, tão pouco de mim. Tenho nada.


“Quem roda na roda fica contente. Quem não roda se fode”, disse uma vez o senhor Caio. Não obedecer ao movimento da roda às vezes me faz mal. Me deixa longe, me torna coadjuvante de uma história sem pé nem cabeça, de um enredo que prioriza sempre a roda, o movimento contínuo, o viver padronizado. É complicado entender a sociedade. Existe a via que leva ao norte e a via que leva ao sul. Só! E o que a gente faz quando não quer estar em nenhuma delas? Quando não quer seguir nem pro norte nem pro sul? O que a gente faz quando se quer um leste? Pode ser inventado, utópico, não importa. Mas por que não existe uma via que leva ao leste? Nem que seja só pra mim. Mas o diferente assusta. É difícil aceitar o deslocado-careta-que-pensa-demais-e-que-vive-de-menos, é assim que eles falam.
Tentaram me convencer de que o sul é melhor, menos problemático. Quase fui. Mas acabei percebendo que não era uma boa escolha. Lá é tudo muito amargo, contido. As pessoas que vêm do sul são sempre fechadas em si, transtornadas interiormente e juram que nada é capaz de atrapalhar a sua maneira moderada de viver. Aí tentaram me convencer de que o norte é melhor, menos monótono. Quase fui. Mas não, pro norte eu não vou porque. Porque lá é tudo muito exagerado, forçado. Aqueles que vêm do norte são sempre pateticamente donos de si. Extravagantes, desregrados demais. Adrenalina, por adrenalina, entendem? E a ausência de um propósito em quase tudo.
Qual é o problema em existir um leste?
Vou contar como o imagino. Se acaso existisse uma via que levasse ao leste ela seria uma ruazinha torta, tenho certeza. Porque no leste não existe um padrão. Ou melhor, o único padrão ou regra que é preciso seguir é fugir dos excessos. Todo mundo tem um pouquinho de norte e um pouquinho de sul dentro de si. Só no leste isso seria equilibrado da maneira exata e saudável. A rua seria torta porque no leste não é proibido seguir a própria opinião, não é proibido ser o que é. E quem no mundo não é um tanto torto?
Eu ainda penso naquele amor, se é que querem saber. O Amor que a roda me roubou, que foi levado pro norte. E não pude fazer nada mais do que acompanhar com o olhar. Sumindo, sendo engolido por ela. De que adianta me torturar, lamentar me lembrando de quando ele, o Amor, era só amor? E não havia distância alguma entre nós, a não ser nós mesmos limitados pelos nossos próprios receios.
Pedi que voltasse, pensei em viajar pra lá e resgatá-lo mas. Mas o norte domina, o norte persuade. E se eu quiser ficar por lá também? Não, eu não posso buscá-lo. O Amor deve estar tomado pelo prazer das drogas do norte, pelas facilidades de um mundo sem limites pra imaginação. O problema, Amor, é quando você começar a viver só a imaginação.
Escrevi algumas coisas bobas pra ele, mas nunca tive coragem de mandar – talvez por serem bobas.
Volta. Volta enquanto há tempo. Volta enquanto te quero de volta, enquanto temos alguma coisa pra conversar, enquanto você ainda tem um tanto de sul em você. Volta enquanto nutro por nós dois o nosso amor.
Estive pensando dias desses. Se você decidisse voltar poderíamos construir uma estradinha pequena sentido leste, só pra nós. Com algum tempo de trabalho e um bom bocado de paciência a gente conseguiria, tenho certeza. Poderíamos enfeitá-la também, o que acha? Colocaríamos as nossas cores favoritas nas beiradas, escreveríamos no chão as nossas frases, e depois...

Besteira. Não vai voltar, eu sei. Não vai existir nunca essa estradinha pequena sentido leste. O Amor já está distante, acomodado em seu canto. Mas ainda espero, claro, no mesmo lugar de sempre. No meio de tudo isso. Entre as duas grandes vias, sem saber pra onde ir.